O menor dos problemas


Acordei com o sol batendo na cara. Nada novo, né? Mas sei lá, hoje eu queria ficar de boa. Acordar tarde. Ontem eu andei de um lado para o outro. Ninguém queria saber de comprar nada. Geral correndo. Geral sem olhar. Não tinha ninguém na rua. Mas eu também já sabia que isso ia acontecer. Nessas horas nego quer ficar com a família, né não? Mas os PM também não tá era meio novo pra mim. É claro que eles deviam estar lá, em algum lugar, na espreita, sem farda. Mas eu não conseguia ver e isso é foda. “Vai rolar muito assalto”, geral tava falando. E eu fiquei com medo. Não de algum levar algo, porque é aquele lance, eu não tenho nada. Só tenho essa cara de noia mesmo. E essa que á a merda. Ser confundido com bandido. E hoje eu não podia nem comprar minha caixa de bala. Porque ta tudo fechado. Merda. Eu devia ter comprado antes. Eu sabia que isso ia rolar. Eu não andei correndo, eu não mudei minha rotina. Eu não entrei em casa e nem tranquei porra nenhuma. Minha casa não tem tranca. E nem porta. Eles chamam a gente de menino de rua. Mas essa rua não é nossa. Meninos de rua são eles, os que mandam nela. Os que podem sair dela quando querem. Durante o mês de dezembro geral abre seu lado papai noel e resolve fingir que eu existo e preciso de comida, de carinho de brinquedo e da porra toda. Mas hoje, na frente da mesa lotada de comida e pisca-pisca, as reza são só por eles. E eu sou o Menor dos problemas.